Tuesday, August 01, 2006

O BOM CERTIFICADO


O BOM CIDADÃO
Um dia passei de carro pela cidade de Tomar. Estávamos em pleno Verão. Tirei a camisa tal era o calor. Não me livrei, dias depois, de ter uma queixa na PIDE pelo facto. Ficou em nada. A PIDE tinha mais que fazer. Nunca soube quem tinha sido o bufo que me tomara por estrangeiro, porque foi essa a ideia da participação. Como era magro e tinha o cabelo claro e vestia muito mal, facilmente me confundiam. Quando eu falava, mais se confirmava, pois eu nunca me livrei totalmente do sotaque de “micalês de fila”. Era quase intraduzível o meu português, por essa razão eu, às vezes, imitava o lisboeta, com dificuldade, claro! Um colega meu, preocupado com o meu comportamento e bem estar, disse-me para me dirigir por carta ao director do Instituto Geográfico (onde eu na altura trabalhava) a solicitar uma declaração de bom comportamento moral e cívico. Assim o fiz e, dentro do prazo (estávamos no fascismo), lá recebi a declaração. Ainda hoje a guardo, por via das dúvidas. E, também, diga-se em abono da verdade, para mostrar às mães das moças com quem eu suponha namorar. O resultado era óptimo, pois antes de ter aquela declaração, quando iam tirar “informes” sobre mim, havia quem dissesse o pior. Já pagaram todos/as pela língua, mas isso é outra questão. Vem isto a propósito ou a despropósito - como quiserem - da lista tornada pública pelo Ministério das Finanças de pessoas mal comportadas tributariamente. De repente, uma tal Maria M. M. F. Rodrigues devia ao fisco à volta de catorze milhões de euros. Minha Nossa! Quis logo saber quem era... Não, não era, não. Em Portugal tudo pode acontecer desde que meia dúzias de rapazes destruíram o Estado. A caça está aberta. Há caçadores. Não sabemos qual é a caça. Deve ser tudo que mexe. Calculo. O Estado português, o mesmo que obrigava a passar-se certificados de bom comportamento (como o meu) está agora a publicar, por tudo que é merdia, parte do comportamento que é reprovável e que diz respeito aos cidadãos portugueses. Que Estado é este? Minha Nossa! Eu nunca acreditei que tal pudesse acontecer. Pensei que se tratasse de uma hipotética ameaça. Há coisa de uns dez dias recebi de um organismo do Estado um cheque no valor de 14.94 euros que o mesmo me devia há 14 anos. Na altura equivaliam a quase três contos de reis. Com esse dinheiro, não se podia passar uma noite com uma moça de programa, mas uma boa tarde agitada ninguém a tirava. Hoje, sem termos direito a qualquer excitação, só dá para um copo e muito pouca conversa. Como é sabido, os portugueses não se comportam mal apenas com o fisco. São verdadeiros criminosos na estrada. Nada de listas! Alguns levam e dão no cu em recintos públicos. Nada de listas! Muitos chulos que vivem à custa de pobres mulheres. Nada de listas! Mulheres e homens contaminados com o vírus da sida e que tornam as relações sexuais um perigo de morte. Nada de listas! Os custos dos vestidos que o Estado paga às mulheres dos ministros, presidentes (República/Regionais/Assembleia), governadores (BP/Civis), embaixadores, diplomatas – são milhares. Nada de listas! Horas de voo fingindo trabalho oficial e respectivas horas extraordinárias dessa gente. Nada de listas! Relações dos que utilizam os recintos públicos para darem quecas. Nada de listas! Os que batem nas mulheres e maltratam os filhos chegando a matá-los com tanta pancada (existem estatísticas oficiais). Nada de listas! Mulheres “modernas” que agridem os maridos (registos policiais já os há). Nada de listas. Os que não respeitam o Segredo de Justiça e informam os merdia. Nada de listas! Os que utilizam falsos atestados de doença para passarem férias e/ou gozarem de descanso. Nada de listas! Os que devem aos sapateiros, merceeiros,leiteiros, talhantes, stand de automóveis. Nada de listas! Os que receberam subsídios do Estado e/ou União Europeia e os desviaram para o mau caminho. Nada de listas! Os que compraram casa e estão pendurados. Nada de listas! Bem, vou acabar por aqui, senão o padeiro ainda me bate à porta com uma lista negra. Safa! Ai que bom! Nada de listas! Assim que puserem o meu nome em alguma lista, eu mando publicar o certificado do Estado Novo que me considera um cidadão exemplar. Garanto que os levo até à barra dos tribunais ou de São Julião na pior das hipóteses.
PS:
Os amigos, os parentes, as relações sociais dos visados vão ser arrastados para a lama. Hoje, já ninguém liga se tiver uma puta ou um paneleiro na família. Até já mudaram de nome. Antigamente era uma vergonha. Hoje, faz parte da disfuncionalidade ou melhor da nossa realidade. Ai que vergonha, ele vem na lista! Qual lista? A da prostituição? Não, seu palerma! A pior de todas! A do Ministério! Fujamos, que horror! Que baixo nível! Que degradação!
manuelmelobento
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