Sunday, February 25, 2007






DA BATALHA DA ÁGUA NA AVENIDA ÀS ROMARIAS ESTRADISTAS


Eu sinto-me muito mais perto do macaco do que do ser humano. Não é bem esta frase que li algures num livro de Fernando Pessoa, mas o espírito da mesma não deve estar muito longe. Pessoa leu uma frase parecida num texto de Haeckel e citou-a. Achei piada ao seu sentido porque muitas vezes em deambulações neuronais faço esta opção. Não só me considero muito próximo do macaco, como também de muitos outros animais meus companheiros universais. Fisicamente sou um todo nada diferente dos primatas: tenho muito menos pêlos. Porque não vejo os macacos a construírem altares a deuses nem a escreverem Bíblias misteriosas descrevendo acções com deuses que descem à Terra e fornicam com virgens para criarem deuses, eu penso ser um deles (macacos). Claro que como macaco que sou tive muita sorte, pois consegui estudar numa escola pública, em liceus e colégios privados e também na universidade. Isto tudo no tempo do Estado Novo. Bom, isso não era muito difícil. Bastava ter espírito de decoradeira e lá nos promovíamos. Os salazaristas não eram lá muito espertos. O que eles apreciavam, sobretudo, era que não se pensasse pela nossa cabeça. E se o fizéssemos teria de ser repetindo o seu “pensamento”. Quando o Carnaval toca à nossa porta eu refugio-me em qualquer sítio. Não gosto de me divertir por calendário (às vezes coincidia com a minha disposição a época festiva e então entrava em sintonia e lá dava um pé de dança). Julgo eu que o Carnaval é para descontrair e abanar o capacete. Nunca admirei a batalha da água. Admirava-me e admiro-me muito por que razão os micaelenses que não são muito higiénicos adoravam atirar água uns aos outros. Era um mistério e é, mais a mais ao preço que ela está admitindo que se trata também de um bem mundial. São gostos. Há também outra coisa que estranho que é o facto de o Carnaval caracterizar-se por ser uma época de certa liberdade de movimentos corporais e contudo toda a sociedade micaelense (desde o balconista até ao diplomado UA e outros) optar por roupas a rigor e em rigor se manter animadamente a dançar a música despida oriunda do calorento Brasil. Existem certos sítios onde até o smoking caíria mal. São excepções! Nunca percebi e agora é tarde. Eu acho que macaco também não percebe. Acabada a época dos saltos, dos bailaricos e dos folgazões vêm a “quarta-feira de cinzas”, restos de um ritual perdido na história que os templos aproveitam para limparem os espíritos do pecado, coisa desajustada neste tempo “telemovelista” onde se desconhece o seu conteúdo por ter perdido a validade. Pergunte-se aos antiquados-actuais chefes de família quando aconselham as crias a utilizarem o preservativo por via das doenças que matam por um lado e pelo outro para “combater” as gravidezes inconsequentes se o pecado é o mesmo. A este dia da semana em São Miguel segue-se um outro fenómeno que muitos, agora, chamam religioso. Centenas de homens e rapazes arranjam um bordão e um xaile e põem-se nas estradas a percorrê-las com um terço nas mãos. Às vezes chove, outras não, porém, isso não os faz desistir. Dizem alguns utentes das estradas com quem falei que se sente muitas vibrações e que se fica muito mais perto de Deus. Um Deus que lhes é comum mas que faz com que cada um apele a coisas distintas: saúde, dinheiro, boa sorte nos negócios, a compra de uma segunda casa, pagamento e/ou cobrança de dívidas difíceis, uma viagem, etc. Só quando chegam aos templos é que o ministro do culto lhes orienta as rezas e ladaínhas para algo ainda mais superior: que Deus guarde o Bispo da Diocese, o Cardeal Patriarca e os nossos Governantes. Era bom que os nossos governantes, objectos das orações dos romeiros, incluíssem estes dois eventos num roteiro turístico já que estamos voltados para o Turismo numa de imitar a Madeira que nos leva uma dianteira de duzentos anos, apesar de sem água e sem rezas pedestres para entretenimento dos visitantes.
manuelmelobento

0 Comments:

Post a Comment

<< Home