Thursday, October 05, 2006


O PRESIDENTE-PRESIDENTE

Em 1918 foi assassinado em Lisboa Sidónio Pais – designado o Presidente -Rei - por um tal J.J. Costa. Em 5 de Outubro de 1910 a República entrou de serviço para substituir a Monarquia. Os anos que se seguiram à implantação da República transformaram Portugal numa espécie de Portugal logo após o 25 de Abril. Não vou dar muitas explicações senão numa mais chego a Cavaco. Ora bem! Só uma pincelada para nos situarmos. Sidónio chefiou um golpe de Estado e “ofereceu” pouco tempo depois ao povo a possibilidade de este se pronunciar através de um plebliscito acerca do golpe e por conseguinte elegê-lo Presidente. Começou, logo após a eleição, a fazer asneiras. Uma delas, foi tornar a aproximar a Igreja do Estado. Depois, como ordem lógica, quis brincar aos ditadores. Foi-se com um tiro "no meio da testa" em pleno Rocio. Não existe nenhuma relação com Cavaco Silva. Este foi eleito Presidente da República sem revolução e sem um único pensamento político a não ser o facto de repetir muitas vezes ao longo da campanha eleitoral que só queria ajudar. A sua postura de homem hirto ajudou muito aos indecisos. Ponto um: Cavaco é um homem sério. Este artigo não é para colocar em causa este seu aspecto. Tenho dito! Ponto dois: Cavaco não tem ideologia cultural. A sua ideologia provém da sua estrutura bio-psicológica. Digamos que ele é todo virado para a estabilidade económica que favorece a economia de mercado, a burguesia capitalista, o rigor nas contas do Estado à custa do contribuinte (o povo propriamente dito) e outras coisas que como dizem os críticos aristotélicos: improgressividade para muitos e progresso para alguns. Cavaco discursou. Que grande discurso comemorativo! A dinâmica deste foi toda voltada contra a corrupção e a dignificação do Estado. O Presidente Cavaco demonstrou o seu inequívoco amor pela República. Lindo! Até porque na semana anterior vimo-lo rodeado de reis, príncipes e princesas grávidas. Uma alegria para as revistas coloridas. Nada de confusões! A corrupção não dignifica o Estado. Estamos rodeados de corruptos. A comunicação social deve portar-se bem. Ora bem! A semana anterior a este discurso comemorativo-demolidor foi pródiga em denúncias feitas pela comunicação social. O último escândalo difundido descrevia minuciosamente uns truques acerca das compras de material para a Marinha de Guerra. Este escândalo era uma espécie de epílogo de uns outros que os jornais e as televisões vinham transformando em folhetim quotidiano. Todas as semanas os jornalistas dão de Portugal uma imagem que não estávamos habituados. São os corruptos activos e os corruptos passivos. Uns e outros devem ter muita força, pois se a memória não me falha o antigo ministro João Cravinho (PS) foi para o olho da rua porque quis actuar contra os corruptos. Cavaco com este discurso chamou a si o combate à corrupção. A partir deste momento ou ele ou os corruptos. E ainda bem, pois alivia a Polícia Judiciária que tem centenas de inspectores no terreno a ver se consegue apanhá-los. Se existem centenas destes à caça é porque devem existir milhares daqueles a serem caçados... Os jornalistas ouviram uns recadinhos. Vale a pena lembrar o escândalo do chamado “Envelope 9”. Segundo as regras da democracia os jornalistas estão obrigados a informar o público. Se assim não for não são jornalistas nem isto é um sistema democrático. Devia o Presidente ter evitado esta parte do discurso porque podemos pensar que ele quer disciplinar o noticiário. Nos Açores, já existe uma espécie de noticiário disciplinado e respeitador. Agora expandir este tipo de comportamento jornalístico ao país todo é que eu não gosto muito. Ah, eu! Cavaco agradou a todos os papalvos mas desagradou aos tubarões democráticos atafulhados de negociatas. Mas, senhor Presidente, a própria Assembleia da República ex-Nacional não quis atacar legislativamente o combate à corrupção. A questão ficou adiada. Para ocasião mais oportuna... Para já, Cavaco deu palmadinhas no rabinho dos corruptos (pelos OCS sabemos quem são), puxou as orelhas aos jornalistas atrevidos (que até já foram levados ao MP) e arrancou as orelhas aos representantes do povo porque fugiram às suas responsabilidades. Cavaco, como alguns já alvitraram, calendarizou os trabalhos do novo Procurador Geral e disse a Sócrates que também sabia mijar fora do penico. Perdão, isto é muito foleiro. Vou reformular: que ele Presidente estava a elaborar um pequeno “estado da República” e que ele era de facto o Presidente atento e orientador acerca do rumo que o destino da Nação estava a tomar. E não foi ele eleito para tal? Para ajudar o Governo, melhor dizendo: vamos trabalhar à minha maneira. Que se saiba o Presidente não deve meter-se a discursar sobre matérias que dizem respeito a outros Órgãos de Soberania. Ao fazê-lo esvaziou a actuação do Governo e criou um perigoso atalho para um presidencialismo à moda de De Gaulle. Não era o momento próprio nem o local adequado. Se o fez aconselhado pelos seus assessores só tem que os dispensar. Se pensou pela sua própria cabeça, então o caldo está derramado. Com este discurso comemorativo da implantação da República, Cavaco ultrapassou todas as expectativas. Tornou-se o Presidente-Presidente de tudo e todos.
manuelmelobento
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1 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Para quem nunca se engana e raramente tem dúvidas...para quem não lê jornais...digamos que deve ver muita televisão.
E a propósito, enquanto Primeiro Ministro, durante dez anos,com maioria absoluta, desapareceu a corrupção? Ou esta torna-se sempre apropriada para discursos que contentem a quase todos?

7:11 AM  

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